Afirmar seu compromisso com a diversidade social e contribuir com a redução das desigualdades sociais e étnico-raciais foram alguns dos princípios assumidos pela Uesb em 2008, quando teve seu Programa de Ações Afirmativas aprovado no Conselho Superior de Ensino, Pesquisa e Extensão (Consepe). Em 2023, a Instituição celebrou os 15 anos desse marco, comemorando os avanços e atenta às novas necessidades sociais.
A partir de uma série de discussões envolvendo professores, funcionários, alunos e membros dos mais diversos setores da sociedade civil, a Uesb estabeleceu que essa política seria implementada a partir da combinação do Sistema de Reserva de Vagas e de Cotas Adicionais, com foco nos cursos de graduação. Além de pensar o acesso, a Instituição entendeu que era necessário assegurar a permanência desses estudantes na Universidade por meio de uma Política de Assistência Estudantil, bem como fortalecer ações de integração com a comunidade.
Maísa Melo foi uma das servidoras da Universidade que acompanhou esse processo de perto. Uma década e meia depois, ela afirma que o Programa promoveu uma mudança social importante. “A Universidade mudou o perfil dos discentes a partir da implementação do Programa de Ações Afirmativas, deixando de ser uma instituição ‘elitista’ para se tornar uma instituição que passou a englobar as diversas camadas sociais”, analisa.
Pesquisador do assunto e egresso da Uesb, Flávio Passos lembra que a formação acadêmica abre possibilidades viáveis para a construção do futuro. “Com o gradativo avanço das Políticas de Ações Afirmativas na Uesb, os projetos de vida foram impactados significativamente, mas, também, a vida das famílias, das comunidades, dos municípios”, afirma.
Atualmente, o Programa de Ações Afirmativas da Uesb contempla, com a Reserva de Vagas, estudantes de escolas públicas, que se autodeclarem ou não negros (pretos e pardos). Além disso, inclui alunos quilombolas, indígenas, com deficiência, trans e travestis, por meio das Cotas Adicionais.
Desde sua implantação, a Instituição já formou centenas de profissionais que tiveram acesso ao Ensino Superior por meio dessa política pública. “Em todas as áreas profissionais, temos exemplos diversos de estudantes cotistas que enfrentaram muitas adversidades e hoje têm suas vidas e de suas famílias e comunidades transformadas positivamente”, destaca Flávio.
Isamara ingressou na Uesb pelo Programa de Ações Afirmativas, em 2012 (Foto: Acervo pessoal)
Novos universos abertos – Uma dessas histórias vem de Cândido Sales, cidade do Centro Sul Baiano, que conta com pouco mais de 25 mil habitantes. Foi na escola estadual, que leva o nome do município, que Isamara Mendes encontrou nos livros um sonho: cursar o Ensino Superior. “Mainha notou essa minha inclinação para os estudos e fez tudo que estava ao seu alcance para que eu pudesse concluir o período escolar. No entanto, devido à desigualdade social e de informação, acreditávamos que pessoas pobres como nós não poderiam fazer faculdade”, conta.
Até que um dia, um de seus professores, formado na Uesb, apresentou um caminho não só para Isamara como para suas irmãs: a universidade pública. Em 2012, o sonho de menina se tornou real. Isamara foi aprovada em Ciências Biológicas na Uesb e iniciou ali sua jornada rumo à formação de uma futura cientista. “Meu sentimento era que eu começava a reescrever minha história. Algo que, por muito tempo, foi um sonho oculto e distante, havia se tornado possível”, relata.
Isamara durante a graduação em Ciências Biológicas na Uesb (Foto: Acervo pessoal)
Ela ingressou pelo Sistema de Reserva de Vagas, como estudante de escola pública. Os primeiros semestres foram de desafios, mas desistir nunca foi uma opção. “Pude contar com o companheirismo de outras pessoas que partilhavam das mesmas dificuldades e com histórias de vida similares. Juntos, fomos encontrando nossos lugares dentro da Biologia, reconhecendo a universidade como um espaço que também nos pertencia”, defende.
Da Uesb, Isamara alçou voos maiores, concluindo o Mestrado e o Doutorado na Universidade de São Paulo. Hoje, ela realiza seu pós-doutoramento na Universidade Federal da Bahia, com o olhar científico voltado para o estudo do comportamento de formigas. “Sou muito grata em dizer que essa política mudou o rumo da minha história. O acesso à universidade me permitiu descobrir novos sonhos e mostrou que eu poderia ocupar muitos outros espaços”, afirma.
Jarbas concluiu sua graduação em Odontologia em 2015
Quem também teve sua história reescrita a partir do Programa de Ações Afirmativas da Uesb foi Jarbas Nascimento. Natural de Jequié, ele descobriu, aos 19 anos, um estreitamento na artéria do coração, sendo necessária uma cirurgia. Porém, a operação não saiu como esperado e Jarbas sofreu um infarto medular, o que o tornou paraplégico.
Em 2010, ele decidiu ir em busca do sonho de se tornar cirurgião-dentista e foi na Uesb que encontrou a porta de entrada para essa realização. Aprovado no Vestibular, por meio das Cotas Adicionais para pessoas com deficiência, Jarbas concluiu sua jornada em 2015. “Desde o momento que entrei na Uesb, houve muitos desafios enfrentados, principalmente questões de acessibilidade, mas tive colegas, professores e funcionários de excelência”, lembra.
Superando essas barreiras e todos os desafios impostos nesse percursos, o cirurgião-dentista construiu sua história e se orgulha dela. “Sou casado e tenho duas lindas filhas. Hoje, sou um profissional da Saúde do município de Jequié”, conta.
Em 2023, o Consepe implementou novos avanços nas Ações Afirmativas da Universidade
Sempre em frente – Em setembro de 2023, o Consepe aprovou a renovação do Programa de Ações Afirmativas da Uesb por mais de 15 anos. Em diálogo com a comunidade, o compromisso social com a inclusão segue com novos avanços. Entre as novidades, a Universidade aprovou a inclusão de travestis e transexuais entre os grupos sociais que têm direito às vagas de Cotas Adicionais. Além disso, implantará um processo seletivo específico, baseado na nota do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), para os candidatos de Cotas Adicionais.
Outra novidade é a implantação de uma banca de heteroidentificação, que avaliará os aprovados na Reserva de Vagas que se autodeclarem negros. Por fim, todos os candidatos que cursaram do 6º ano do Ensino Fundamental até o 3º ano do Ensino Médio em escola pública terão direito à isenção da taxa do Vestibular da Uesb.
“É necessário que a gente tenha uma sociedade que reconheça a diversidade da experiência humana, reconheça a diversidade da formação das pessoas, da orientação sexual, das identidades de gênero, porque a humanidade é diversa. Não podemos nos permitir estarmos em uma instituição pública, trabalhando com recursos públicos e reproduzindo preconceitos e exclusões”, avalia o professor Luiz Otávio de Magalhães, reitor da Uesb.
Essa e outras reportagens estão disponíveis na 4ª Revista Uesb; baixe aqui